justificação teórica dos procedimentos especiais*
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SUMÁRIO:
1. Ação, processo
e procedimento. 2.
Classificação dos procedimentos. 3. Critérios de eleição das causas.
4. Procedimentos especiais e juizados especiais.
5. Procedimentos especiais e autonomia do direito processual.
6. O sistema do CPC em tema de procedimento. 7. Procedimentos especiais na legislação
extravagante. 8.
Procedimentos especiais e cumulação de pedidos.
9. Conclusões.
1.
Ação, processo e procedimento. Na
doutrina como na própria legislação, a palavra ação
tem-se prestado a variações tão notórias quanto indesejáveis do ponto de
vista da precisão da terminologia, até mesmo quando empregada por juristas de
tomo ou em um mesmo texto legal. Entre essas múltiplas acepções, mostra-se
particularmente persistente na linguagem forense, conquanto já abandonada pelos
especialistas, a de “conjunto ou complexo de atos que compõem o juízo”
[1],
à qual melhor corresponderia a palavra processo.
Na
busca de um conceito integrado e abrangente, cogitou-se de caraterizar a ação,
segundo os cânones lógicos da Escolástica, através da quádrupla abordagem
pelos ângulos subjetivo (em que aparece como atributo do sujeito e seria um direito
do autor), objetivo (em perspectiva de causa final, na qual a ação é meio
ou remédio jurídico), material (onde o conceito de ação se funde
com o de pleito ou demanda) e formal (visualizando a ação como série de
atos ordenados
no sentido
da solução
do litígio).
[2] Mais
uma vez, como se pode ver
neste último enfoque, recai-se na identificação entre ação e processo, que
terminologia atualizada e cuidadosa não tolera.
Servem
essas considerações para lembrar a origem de expressões tantas vezes
repetidas, como “ação ordinária”, “ação especial”, “ação sumária”
e assim por diante -- que convém evitar, reservando-se o emprego do termo ao
significado com o qual se tornou corrente na doutrina de hoje, ao menos entre os
processualistas, a saber, o direito autônomo de agir em face do Estado-juiz a
fim de pôr em movimento o aparelho judiciário relativamente a determinada
situação jurídica concreta.[3]
Há, pois, ações que dão origem a processos
cuja tramitação se submeterá a procedimento
ordinário, sumário ou especial.[4]
Certo,
pode-se aceitar, a bem da simplicidade, o emprego da palavra ação
também no sentido correspondente ao enfoque “objetivo”, de causa final, da
tetralogia escolástica, com o significado de meio ou remédio de que se serve
alguém para buscar a tutela daquilo que pensa e afirma ser o seu direito. Visto
assim, facilmente se confunde o conceito de ação com o de pretensão de
direito material -- embora a distinção seja sempre possível e necessária. É
assim que se explica, de resto, o uso repetido e geralmente aceito, no título I
do Livro IV do Código de Processo Civil, do vocábulo ação
seguido de expressão mais propriamente definidora do bem da vida cujo reconhecimento ou atribuição o autor persegue em
juízo, ou da relação jurídico-material por ele afirmada: “ação de
consignação em pagamento”, “ação de depósito”, “ação de usucapião”
e assim por diante.
Contudo,
nota-se que a epígrafe do mesmo Livro anuncia procedimentos,
nesse particular com impecável correção. Esse é um dos pontos em que o
vigente Código se revela superior tecnicamente a toda a legislação
precedente, que invariavelmente falava de “processos especiais”. É verdade
que o emprego indiscriminado das duas palavras não é raro, mas a distinção
existe e cumpre respeitá-la, a bem da clareza das idéias. Com efeito, o processo
é o conjunto mesmo dos atos entre si encadeados e orientados no sentido da
solução do litígio, ao passo que por procedimento
se designam a forma, a ordem e a disposição dos mesmos na série, variáveis
segundo as exigências da relação de direito material a ser tratada ou segundo
outras necessidades e conveniências que ao legislador tenham impressionado. Com
efeito, variáveis e multifários são os provimentos jurisdicionais que podem
resultar do processo civil, e a essa multiplicidade corresponde, por vezes, a
necessidade de também variarem a quantidade,
a substância
e a
disposição dos
atos conducentes
àquele resultado.
O número, a
natureza e
a posição
relativa que
tais atos
assumem no
conjunto afeiçoam-se às
diferenciadas necessidades,
determinando ritos
ou procedimentos.[5]
O procedimento é,
pois, o conteúdo cujo continente
é o processo; aquele é em relação a este como a dezena em
face do número concreto --
que pode ser menor do que a dezena, ou conter mais de uma.[6]
Não
é correto, pois, afirmar-se que a distinção é meramente “externa e
formal”. Ou que o discrime adotado no atual Código de Processo Civil , ao
adotar a denominação de procedimentos para designar os de seu Livro IV, só se
destinasse a sublinhar a presença, neles, como caraterística própria, de atos
específicos que os extremam do “procedimento comum”. Não
se perca de vista, aliás,
que o diploma legal
citado jamais
fala de
“processo comum”, mas sim e sempre de procedimento comum, inclusive quando cuida de sua subdivisão em
ordinário e sumaríssimo.
Há
um trecho do citado Código onde se usa com exclusividade a palavra
“procedimento”, sem jamais aludir a “processo” ou “ação”: o Título
II do mesmo Livro IV, relativo à chamada jurisdição voluntária ou
graciosa. Esse é um indicativo claro de que o legislador optou por uma
diferenciação nítida entre os conceitos: com efeito, em se tratando de
“processo” sem contraditório e sem partes, embora se haja tomado o partido,
por razões históricas, de manter essas figuras paraprocessuais no Código, o mínimo
a fazer-se era deixar clara a natureza atípica das mesmas. A inexistência aí
de processo autêntico, concebido como actum
tria personarum, com pressuposto na lide, obriga a admitir que só se trata
de procedimento, não processo. Bem
por isso, aliás, os textos submetidos àquele Título nunca aludem a partes,
mas só a interessados.
Falamos,
pois, de procedimento no sentido em que o direito legislado emprega a palavra,
significando forma de proceder. Não
rejeitamos a sugestão da doutrina moderna no sentido de que “todo poder se
exerce mediante um procedimento,
caracterizando-se este como processo, desde
que seja feito em contraditório.[7]
Mas essa é, certamente,
uma outra acepção, baseada em premissas metodológicas diversas
daquelas do legislador do CPC e, pois, inadequadas à sua exegese: nessa
perspectiva, seria necessário admitir-se que toda atividade estatal se
traduzisse em procedimentos, alguns processuais, outros não.
2.
Classificação dos procedimentos. Em
tema de procedimento (ou rito, ou forma do processo), a técnica legislativa
usual é a de começar-se pela definição de um modelo procedimental básico,
destinado à adoção na generalidade dos casos, verdadeiro rito-padrão, para
se estabelecerem depois, com base nele, as variações por supressão, acréscimo
ou modificação de atos, donde resultarão procedimentos mais ou menos
distanciados do modelo fundamental, segundo a intensidade e número dessas
alterações.
Em
regra, o procedimento-tipo é formal e solene, procurando cercar o exercício da
função jurisdicional das mais amplas garantias e franquear às partes os mais
largos caminhos de discussão, de prova e de impugnação das decisões.[8]
O procedimento assim estruturado - geralmente denominado comum ou ordinário - serve ao volume maior e principal das causas,
às situações mais freqüentes e destituídas de peculiaridades aptas a
justificar um tratamento diferenciado. Por outro lado, como já ficou brevemente
mencionado, esse procedimento por assim dizer genérico funciona também como um
standard básico, seja no sentido de
que a partir dele se constróem os outros, específicos, seja porque em
numerosos casos a diversidade destes em confronto com aquele é parcial e
condicionada, de tal sorte que o trâmite processual, iniciado em forma
diferenciada, retorna ao leito comum
do rito básico a partir de certo momento ou a depender de uma dada condição.
A tudo isso se acresça que, exatamente por terem sido fixados como um
modelo, os termos do procedimento especial prevalecem também no
especial, na medida em que as regras jurídicas a este pertinentes sejam
omissas: vale dizer, as normas do rito genérico enchem os vazios da regulação
dos especiais, a estes aplicando-se subsidiariamente. No vigente CPC, o princípio
vem expressamente consagrado no seu art. 273.
O
ordinário (ou comum) não é somente o procedimento de mais largo uso. É também
ele que fornece as regras aptas a reger, supletivamente, os demais ritos, nos
aspectos em que estes não se achem especificamente disciplinados. Mais: sua
caraterística de modelo fundamental e sua aptidão para assegurar as mais
amplas garantias fazem dele o procedimento a ser adotado quando o autor pretenda
cumular pedidos a que, em princípio, devam corresponder ritos diversos (CPC,
art. 292, § 2º).
Ao
lado do procedimento ordinário ou comum (desconsiderada, neste passo, a
terminologia do CPC, para tratamento do tema de
lege ferenda), pode-se construir um sumário, ou mais de um, com diferentes
graus de sumariedade. Busca-se atender, por essa via, a que, de um lado, em
determinadas situações, a própria cognição é sumária, limitada ou provisória,
podendo-se por isso dispensar solenidades, abreviar prazos e restringir atuações
das partes (sumário substancial); ou, em outra vertente, a que a urgência da
prestação jurisdicional em certas causas, a simplicidade real ou
presumida de algumas ou a modesta expressão econômica e jurídica de
outras apresentam-nas ao espírito do legislador como incompatíveis com a
lenta, solene e onerosa tramitação ordinária (sumário formal).
[9]
A
rigor, no mais lato sentido da expressão, seriam também “especiais” os
procedimentos assim construídos, sumários ou sumaríssimos, na medida em que
representam eles um desvio do modelo fundamental. Contudo, tem-se reservado
aquela designação, em regra, a procedimentos instituídos de modo específico
e individualizado para o trato de determinadas causas, em que a pretensão jurídico-material
apresenta peculiaridades tais que exijam uma particular forma de tratamento em
juízo. Embora pertença obviamente ao legislador do processo a escolha dessas
causas, é igualmente claro que só no Direito Material pode ele encontrar os
elementos indicadores da necessidade ou conveniência de estabelecê-los em
correspondência com determinadas “ações” (rectius,
pretensões de Direito Material).[10] Em regra, o
problema de ser ou não ser completa a cognitio não se acha envolvido, influindo, isto sim, na criação
das formas sumárias. A cognição, nos processos submetidos a rito especial,
costuma ser plena em profundidade e, se isto não ocorre em alguns casos, o dado
é meramente acidental. O que pode haver é limitação em extensão da cognitio, pela
razão de ser por hipótese limitado o próprio objeto do pedido.[11]
3.
Critérios de eleição das causas. Não é provável que se possam
sistematizar com êxito os vários motivos que podem levar o legislador à adoção
de procedimentos especiais. O que acima ficou dito sobre a influência, nessa
matéria, da especial configuração da relação jurídica material contenciosa
apenas aponta o mais razoável dos critérios e o que talvez devesse ser o único,
pois só ele se justifica plenamente do ponto de vista doutrinário. Aliás, em
princípio, a generalização do procedimento ordinário deveria ser a mais
ampla possível, com a decorrente redução dos ritos especiais. Estes, ainda
nos limites do aludido critério, só estariam justificados quando aquele fosse
absolutamente inadequado para o tratamento em juízo da matéria considerada.[12]
A
verdade, entretanto, é que os legisladores não se orientam somente por essa
diretriz. O peso da tradição histórica, com as complicações e incongruências
decorrentes de múltiplas fontes de influência, nem sempre coevas e entre si
coerentes; a eventual interpenetração, em um mesmo processo, de elementos de
diversas modalidades de tutela jurisdicional (de cognição, de execução e de
cautela); razões de conveniência momentânea e local, com caráter meramente
emergencial; até mesmo a simples impaciência do legislador frente à
morosidade do aparelhamento judiciário em contraste com a pressão da demanda
social -
tudo influi no sentido de retirar da vala
comum do rito ordinário um número crescente de “ações”, em
antagonismo com a recomendação da doutrina, esta cada vez mais inclinada à
redução numérica dos tipos
procedimentais como
imperativo da simplificação e da racionalização.[13] Não há negar, por
certo, a possibilidade de uma correta sistematização, seja a partir da intrínseca
irredutibilidade de
certos procedimentos
ao ordinário,[14]
seja com base na idéia de “exceções reservadas”, embora esta acabe por
conduzir à suposta sumariedade de todo procedimento especial.[15]
O que não se pode aceitar é a proliferação caótica e indiscriminada,
submissa a razões sem qualquer compromisso científico.
Nem
se defende o meter à força no trâmite ordinário, qual em leito de Procusto,
causas que não podem ser nele eficientemente tratadas, ou para as quais ele
representa uma demasia. Também não se nega que a complexidade crescente da
economia, com a decorrente multiplicação dos tipos negociais e fatos jurídicos,
freqüentemente se reflete nos domínios do processo, de modo a impor a criação
de modelos procedimentais igualmente novos. Conviria, entretanto, que se
resistisse mais a essa tendência multiplicadora, compensando-se-a, outrossim,
com a revisão dos procedimentos especiais cuja sobrevivência talvez já não
corresponda a uma necessidade real e presente da vida. É bem provável, de
resto, que a modernização do procedimento ordinário, escoimado de seus
excessos de formalismo e de solenidade, enriquecido de recursos tecnológicos de
há muito disponíveis mas ainda não incorporados a ele, tornasse dispensáveis
e superados alguns dos atuais procedimentos diferenciados. Isso porque, sem dúvida,
a morosidade e a ineficiência do pesado e obsoleto processo comum, de mãos
dadas com o crônico déficit de
recursos materiais à disposição do Judiciário, são seguramente responsáveis,
em parte deveras significativa, pela proliferação dos ritos especiais onde nem
sempre existe uma verdadeira incompatibilidade com aquele. A especialidade do
rito não é mais, em tais casos, do que um expediente de fuga aos
inconvenientes do ordinário, assim como em tempos foi, e por inércia ainda é,
a forçada e indiscriminada adoção de ritos sumários sem a correspondente
sumariedade da cognição.[16]
O
aprimoramento técnico da legislação processual, também em outros aspectos,
poderia contribuir para a redução numérica do elenco dos procedimentos
especiais. Estes são conseqüência, em alguns casos, de invasão do processo
de conhecimento por elementos pertencentes ao executório ou ao cautelar. Disso
tivemos exemplo na velha “ação executiva” do nosso primeiro código
nacional de processo, e ainda o temos na ação de nunciação de obra nova, que
bem poderia seguir o procedimento-padrão, não fora o fato de incorporar medida
de ordem nitidamente cautelar, que melhor se acomodaria no seu campo específico,
a exemplo do Direito Português.[17]
4. Procedimentos especiais e juizados especiais.
Ao lado dos procedimentos especiais de que temos até aqui tratado, cuja
justificação se encontra na especificidade da relação jurídico-material a
ser tratada, vem-se impondo rapidamente uma nova categoria, aquela dos
procedimentos que, a mais de serem especiais, devem ser conduzidos por juízos
também especiais. Não se trata de simples acréscimo à categoria dos
processos que se precisavam acomodar formalmente à configuração diferenciada
do órgão julgador (feitos da competência do Tribunal do Júri, processos da
competência originária dos colegiados etc.): aqui, procedimento e juízo são
especificamente criados um para o outro, com vistas a um determinado objetivo e
no pressuposto de que a operação de um supõe a presença do seu correspectivo.
Tal é o caso dos juizados especiais e de pequenas causas, umbilicalmente
ligados ao procedimento que para eles se criou, especial e exclusivamente. No
Direito Comparado, seus equivalentes estariam, verbi
gratia, nos small claim courts da
prática norte-americana e talvez nos multisseculares
Tribunales de las Aguas de Espanha, particularmente o de Valência.[18]
O
modelo adotado no Brasil corresponde, a toda evidência, a mais outra tentativa
de fuga à lentidão e complexidade do rito comum e ao congestionamento invencível
dos tribunais ordinários, buscada também por via de uma verdadeira mudança de
cultura, envolvendo a criação de juízos imbuídos de novas concepções e
mentalidade menos comprometida com o passado e com o tradicional.[19]
Não quer isso dizer que se haja optado por uma alternativa à jurisdição do tipo que vem sendo preconizado, um
tanto apressadamente, por alguns especialistas: a atividade da qual se cuida é
rigorosamente jurisdicional, desenvolvida pelos mecanismos estatais voltados à
composição dos litígios, embora com algumas notas de suma originalidade.
No
Brasil, a pioneira introdução desses procedimentos e juízos, ainda em caráter
absolutamente informal e sem respaldo legislativo, se fez no Estado do Rio
Grande do Sul, sob os auspícios da respectiva
Associação de
Juízes (AJURIS).[20]
Mesmo despidos de qualquer autoridade formal, os então chamados
“conselhos” alcançaram notável êxito, suscitando um debate nacional donde
se originou a edição da Lei nº 7.244/84, institucionalizadora dessa
modalidade de prestação jurisdicional. Confirmando seu pioneirismo no assunto,
o Rio Grande do Sul veio a ser também o primeiro Estado a editar lei local
disciplinando o Sistema de Juizados de Pequenas Causas, que entraria em
funcionamento efetivo em 1986, novamente com absoluta primazia nacional. A experiência viria a demonstrar que a idéia-força de
melhorar as condições de acesso à jurisdição envolvia necessariamente uma
nova postura, uma nova filosofia e uma nova estratégia, tudo a pressupor uma
concepção também renovada da própria função
jurisdicional, exatamente como fora previsto,[21]
como de igual modo antevista fora, por razões idênticas, a tenaz resistência
oferecida então e ainda hoje à inovação, por parte dos setores mais
ortodoxos da doutrina processual e
da comunidade forense.[22]
Revelou o sistema, outrossim, uma inesperada utilidade como fecundo
laboratório de experiências para soluções e praxes que já começaram a ser
absorvidas pelo processo civil “geral” e incorporadas ao dia-a-dia da prática
judiciária.
A
idéia se impôs pelos seus bons resultados, a ponto de subir sua expressão
legislativa à hierarquia de norma constitucional, já não como simples
autorização, mas na figura de determinação imperativa de implantação dos
novos órgãos judiciários, inclusive com a extensão de sua competência, mutatis
mutandis, à esfera criminal (Constituição da República, art. 98, I).[23]
5. Procedimentos especiais e
autonomia do direito processual. À parte as objeções já lembradas à adoção
de procedimentos especiais e sobretudo à sua descontrolada multiplicação - ligadas a aspectos eminentemente pragmáticos
da atividade forense, eventualmente embaraçada por essa pletora de ritos e
formas - outra restrição já lhe foi feita no puro
plano teórico, questionando em termos estritamente técnico-jurídicos a
admissibilidade do procedimento
especial como categoria. Assim, certos setores da doutrina vêem na existência
de tais procedimentos uma concessão à idéia de subordinação do Direito
Processual ao Direito Material. Vista desse ângulo a questão, seria incompatível
com a idéia de autonomia a diferenciação de procedimento com base nas
peculiaridades do direito subjetivo material afirmado pelo autor: representaria
isso uma intromissão dos critérios do direito dito “substantivo” na solução
de um problema estritamente processual. A crítica aduz, outrossim, que a
rigidez característica dos procedimentos especiais limita a atividade do órgão
jurisdicional, prendendo-a a regras rituais determinadas antes mesmo de se saber
se as normas de Direito Material invocadas são efetivamente aplicáveis ao caso
concreto, dúvida que só o julgamento de mérito poderá suprimir em
definitivo.[24]
O
primeiro ponto da objeção leva longe demais a idéia de autonomia, além de
desconsiderar o grande paradoxo de que o processo, sendo busca da verdade, nada
mais é, enquanto tramita, do que um sistema de verdades provisórias,
continuamente aperfeiçoadas. E, mais, dessa idéia extrai conseqüências que não
são necessárias. Autonomia não é antinomia. Os campos, ramos ou
departamentos em que se distribui a ciência jurídica não são estanques e
incomunicáveis; ao contrário, interpenetram-se e mutuamente se influenciam.
Tenha-se presente, de resto, no atinente especificamente às fronteiras entre
Direito Material e Direito Processual, que elas nem sempre se apresentam
precisas e nítidas, existindo ainda territórios disputados, como o da prova e
o da legitimatio ad causam, apenas
para exemplificar. Nada há de estranho, portanto, em que se atenda, na
disciplina do procedimento, a eventuais particularidades do Direito Material segundo
afirmado pelo autor, que talvez tornem
a relação jurídico-substancial insuscetível de tratamento judicial eficiente
e adequado dentro do procedimento genérico. Para sustentar-se a autonomia do
Direito Processual não é necessário negar-lhe o caráter instrumental que
todos lhe reconhecem.
O
segundo aspecto da crítica radica no insuperável e fascinante paradoxo de só
se poder saber o que há para julgar depois que se julgou. Antes disso, tudo se
tem de basear na razão afirmada pelo autor, tomada como se verdade fosse. E não apenas
para a identificação do procedimento a ser seguido, mas igualmente para uma
vasta gama de efeitos outros: definição da competência do foro e do juízo,
fixação do valor da causa, necessidade ou não de oitiva do parquet, verificação das “condições da ação” e assim por
diante. Se é exato que o processo é eminentemente dialético, e assim precisa
ser para alcançar seu objetivo final de superação do litígio segundo o
Direito, não é menos certo que lhe é impossível prescindir, até que se
chegue a tal resultado, das verdades
provisórias oferecidas pelas partes. Nisso se baseia, aliás, a doutrina
contemporânea da ação e de suas condições. E nisso, de resto, talvez
residam todo o tormento e a glória toda dos operadores e estudiosos do
processo.
Relativamente
a qualquer ação submetida a determinado rito especial, quando a lei do
processo remete ao Direito Material para a identificação das hipóteses do seu
cabimento, quer significar que o autor só será admitido a demandar sob tal
procedimento descrevendo uma fattispecie
correspondente a algum dos modelos abstratos inseríveis no rito considerado. E
não, naturalmente, que dita afirmação tenha de ser sempre verdadeira. Não há
confundir a indagação sobre se o procedimento foi adequadamente escolhido
(vale dizer, se está ajustado à espécie de pedido formulada) com esta outra
sobre se o autor tem realmente o direito que invoca (isto é, se o pedido deverá
ser julgado procedente).[25]
6. O sistema do CPC em tema de procedimento. O legislador do Código pensou poder prescindir de uma “parte
geral” em que se reunissem as disposições aplicáveis à generalidade dos
processos. Disso resultou que muitas dessas regras, porque indispensáveis,
restaram perdidas e dispersas em vários pontos do texto, por vezes deveras
surpreendentes e sob epígrafes de todo inadequadas.
Assim,
há um livro intitulado “Do processo de conhecimento” que inclui regras genéricas,
aplicáveis inclusive a outros processos que não o de conhecimento. Outrossim,
outro livro, o quarto, exibe a epígrafe “Dos procedimentos especiais”, como
se estes fossem todos estranhos ao processo de cognição. Anota-se, mais, a
extrema impropriedade do art. 274, que faz entender seja o “procedimento ordinário”
o mesmo para os processos de declaração e executório, pela alusão ao Livro
II. A própria menção ao Livro I é despropositada, já que ali não se cuida apenas
do procedimento ordinário, tendo abrangência geral muitas de suas regras, e
aludindo algumas outras, claramente, a procedimento diverso do ordinário. Todos
esses equívocos decorrem da inexistência de uma parte geral.[26]
Objeção
semelhante pode ser feita ao art. 270, que, além de absolutamente desnecessário,
encerra proposição de todo em todo incorreta. Desnecessário porque não
precisa a lei anunciar previamente
do que vai tratar a seguir;[27]
incorreto por colocar a categoria dos procedimentos especiais ao lado do
processo de conhecimento, do executório e do cautelar, como se constituíssem
aqueles uma quarta classe pertencente à mesma catalogação em que se inserem
as demais. É de justiça ressaltar, já que o autor do anteprojeto tem
suportado sozinho e por vezes imerecidamente o peso da crítica, que a incongruência
não constava do texto remetido ao Congresso Nacional: foi na Câmara dos
Deputados que o artigo recebeu o esdrúxulo acréscimo da parte final.
Como
quer que seja, o sistema incorporado ao CPC, na classificação dos
procedimentos, inovou em relação à legislação precedente e até mesmo em
face da doutrina assentada. A primeira grande divisão se faz em procedimento
comum e especial; só em um
segundo momento, como subclassificação,
vai surgir menção ao procedimento ordinário, integrando juntamente com o sumaríssimo
aquela primeira categoria. Daí que a expressão procedimento comum não se refere a um determinado rito ou forma
processual; designa, isto sim, uma categoria abstrata que abarca dois tipos de
procedimento.
Inexiste,
já se vê, pelo menos em teoria, uma tripartição em ordinário, sumário e
especial, como é da tradição e da doutrina. A esse resultado nosso Código só
chega em duas etapas distintas de classificação, pois as duas primeiras
classes se agrupam sob a denominação de comum. Importa, pois, evitar a confusão (na qual, aliás, o próprio
legislador incidiu algumas vezes) que resulta da falsa sinonímia entre comum
e ordinário: aquela classe contém esta subclasse, sendo, pois, mais
extensa do que ela.
Nenhuma
vantagem prática se extrai dessa complicação classificatória. Do ponto de
vista dos procedimentos especiais, que aqui nos interessam prioritariamente, o
dado importante é a subsidiariedade do leito
comum que é o procedimento-padrão: a ele retornam aqueles sempre que não
haja regulação específica em sentido diverso; é no modelo geral que se
buscam as regras para encher os vazios da regulamentação dos especiais e é
sobre a plataforma comum que se constróem as formas diferenciadas. O sistema do
Código cria dúvidas sobre qual seja esse standard:
o procedimento comum
ou o ordinário? Em regra,
será o ordinário, pela razão já mencionada de não existir, como categoria
concreta, procedimento comum. Pode-se até admitir que, para determinadas situações
excepcionais, esse papel possa ser desempenhado pelo sumário, mas nunca pelo
comum.
7.
Procedimentos especiais da legislação extravagante. As codificações não
costumam ser exaustivas, nem mesmo devem aspirar a semelhante objetivo. Ainda
pertencendo ao ramo do Direito cuja codificação se empreende, determinadas matérias
podem e outras devem merecer regulação em separado, mediante leis especiais.
Sucede que, embora tenham os Códigos também o escopo de reunir em um só corpo
de normas, de modo ordenado e sistemático, todas as disposições pertinentes a
determinada área jurídica, é igualmente certo que eles se vocacionam a uma
certa permanência temporal, a um mínimo de estabilidade e fixidez. Ora, é
consabido que determinados aspectos da realidade social podem achar-se, no
momento da codificação, em fase transitiva ou de rápida mutação, o que
desaconselharia a sua inclusão no código. Quando se fotografa uma realidade
estática ou em movimento lentíssimo (uma montanha, um cômoro de areia),
pode-se contar com a fidelidade da representação fotográfica ao modelo por
longo tempo. Não assim quando o objeto fotografado está em mutação ou em
movimento rápido (o pôr-do-sol; um campo de neve). Também a realidade social
apreendida e normatizada pelo codificador permanecerá por maior ou menor tempo
tal como se achava em tal momento, segundo o grau de estabilidade que tenha
alcançado em cada um dos seus aspectos particulares.
É
igualmente exato que determinados institutos jurídicos, conquanto pertencentes
ao ramo do Direito coberto pela codificação e razoavelmente estabilizados em
sua evolução, são marcados por singularidades de tal ordem que não passariam
sem dano pelo processo de uniformização sistêmica que a codificação supõe.
Essas originalidades podem dizer respeito ao Direito Material ou ao Processual,
mas mesmo aquelas se comunicam inevitavelmente ao campo do processo e, mais
especificamente, ao do procedimento.
Nessa
perspectiva, merecem especial atenção alguns institutos recentemente
elaborados pelo Direito legislado nacional, ou para ele importados, e por isso
ainda em fase de desenvolvimento ou adaptação, bem como alguns outros que,
conquanto antiqüíssimos, merecem uma especial atenção do Poder Público em
razão da carga de interesse social que nele se envolve. Exemplo da primeira espécie
poderia ser o contrato de alienação fiduciária:
da segunda, a locação residencial. Tanto em um como em outro caso, embora
por motivos diversos, a regulação dos institutos não se integra ao direito
codificado, permanecendo em leis esparsas. E daí sói resultar a edição,
relativamente a cada um deles, de lex
specialis de conteúdo misto, regendo tanto os aspectos de Direito Material
quanto aqueles pertinentes ao processo. Vem a ser essa uma outra e prolífica
fonte de procedimentos especiais.
Não
se pode negar legitimidade, em princípio, a essa vertente, desde que
efetivamente se trate de institutos diferenciados por alguma das notas
apontadas. Cumpre advertir, uma vez mais, que o condenável é o exagero e a
desatenção do legislador ao interesse da sistematização e relativa
uniformização dos procedimentos, a fim de que não se caia na situação caótica
denunciada por
Ramos
Méndez[28]
e muito
semelhante àquela que vivenciamos no Brasil.
8.
Procedimentos especiais e cumulação de pedidos. Tendo em conta sobretudo
o interesse da economia, as
leis do processo autorizam e de certo modo estimulam a cumulação de pedidos no
mesmo processo. Os resultados dessa salutar política legislativa, entretanto,
podem ser em grande parte comprometidos pela existência[AFF1]
de procedimentos diferenciados.
O
ponto de contato entre os dois temas está em que a acumulação objetiva de
demandas está condicionada à identidade de rito ao qual se deva submeter a
tramitação de cada um dos pedidos formulados (CPC, art. 292, § 1º, inc.
III). Admite-se, porém, que a cumulação se dê ainda quando inexista tal
identidade dos procedimentos prescritos
desde que o autor, mediante opção pelo rito ordinário, enseje a uniformização
procedimental. No fito de favorecer a cumulação e, por via dela, os interesses
da economia, da simplificação e da prevenção de julgados conflitantes,
faculta-se ao autor, se o prefere, fazer adotar para todos os pedidos em
concurso o rito ordinário, com implícita renúncia ao procedimento especial a priori indicado para algum ou alguns deles.
A
regra jurídica em foco implica duas idéias: a de que todo procedimento
especial é instituído em prol do autor, e portanto disponível a líbito
deste, e a de serem todos os procedimentos especiais redutíveis ao ordinário.
Mas, conquanto não esteja a opção condicionada à anuência do demandado,
pelo menos o segundo desses postulados não é de aceitar-se com tal amplitude.
Pode suceder que o réu seja interessado, quiçá mais do que o autor, na adoção
de procedimento diverso
do ordinário.[29]
Casos há, convém lembrar, em que a angularização da
relação processual só se pode dar após satisfeito algum requisito, a cargo
do autor, condicionante da citação; é o que se dá, verbi
gratia, na ação de substituição de título ao portador e nos embargos de
terceiro: na estrutura dos correspondentes ritos especiais, há exigência da prévia
justificação de determinados pressupostos, sem o que o réu sequer será
citado (arts. 909 e 1.050 do CPC). Pode-se lembrar, mais, que o procedimento
especial das ações possessórias enseja ao réu, sem reconvir, postular a proteção interdital para a sua própria
posse e a indenização de danos (art. 922). Há que pensar duas vezes,
portanto, antes de afirmar-se que o rito especial só interessa ao autor e por
isso é sempre unilateralmente disponível. Em casos como os apontados, nem
sempre é de se admitir, sem anuência do réu, a substituição do rito,
mesmo que para possibilitar cumulação.
Por
outro lado -- e esse é o ponto que ora mais interessa -- há determinadas “ações”
intrínseca e irredutivelmente submetidas ao procedimento especial, impraticável
a conversão para o ordinário. Resulta, pois, que elas são também inacumuláveis
com outras sujeitas a diverso procedimento. Bastaria lembrar um exemplo dramático:
o mandado de segurança. Ou indagar-se da possibilidade de processar-se ordinariamente
uma ação de usucapião, com as imanentes e impostergáveis providências
do art. 942 do CPC,[30] ou de ajustar
ao procedimento genérico atos e
prazos como os do seu art. 915.
Já
o Código de 1939 continha norma similar à enfocada (art. 155, parágr. único),
de aparência igualmente liberal e irrestrita. Mas os tribunais cedo descobriram
a irredutibilidade de alguns procedimentos especiais ao ordinário e tiveram de
vetar, por impossibilidade de uniformização do rito, cumulações requeridas
sob a invocação daquele dispositivo.[31]
E mesmo os setores da doutrina que prestigiam sem ressalvas o
chamado princípio da preferibilidade do
rito ordinário e da plena disponibilidade do procedimento,
independentemente do consensus
partium, recuam frente a certas hipóteses.[32]
A
acumulabilidade de ações a que correspondem diferentes formas de processo -
vale dizer, a incidência do art. 292, § 2º, -
só é possível , em verdade, quando entre os procedimentos envolvidos não se
ache nenhum dos irredutíveis ao ordinário ou dos instituídos também
no interesse e benefício do demandado, ou em contemplação do interesse público.
9.
Conclusões. É do maior interesse, não apenas a bem
da simplificação e da operacionalidade do processo, mas também na
busca do aprimoramento técnico do sistema, que os ritos especiais se reduzam a
número bem menor do que o atualmente existente, de acordo, aliás, com uma tendência
mundial.
Isso
não significa, porém, que se deva condenar ao desaparecimento essa categoria.
O que se impõe é uma criteriosa seleção dos casos para os quais o trâmite
ordinário seria realmente inadequado ou superabundante em atos e formalidades.
Em princípio, o critério dessa seleção terá sempre de levar em conta as
particulares necessidades do trato em juízo da relação de direito material
considerada.
Também
se justifica, embora não na enorme quantidade hoje conhecida, a prescrição
legal de procedimentos especiais para determinadas causas ligadas a institutos
de direito material ainda não completamente sedimentados na legislação
nacional, e por isso não codificados. É aceitável que leis extravagantes
regulem no mesmo texto os aspectos de direito material e aqueles de processo
atinentes ao mesmo instituto.
Igualmente
justificável, e recomendável mesmo, é que se mantenham procedimentos específicos
para as causas submetidas aos juizados especiais e de pequenas causas, com máxima
ênfase na simplificação, oralidade e busca da conciliação.
Não compromete
de modo
algum a autonomia do direito
processual a existência de procedimentos cuja escolha se determina pela
natureza da pretensão de direito material, desde que
essa é apenas
uma das muitas e inevitáveis opções que só se podem fazer a partir
dessa referência.
(Abril de 1994)
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* Conferência proferida no Congresso
Nacional
de Processo Civil - 20 anos de vigência do CPC, Rio de Janeiro, dezembro de
1994.
[1]
Cf. Rezende Filho, Curso
de Direito Processual Civil, vol. 1, p. 142, 9ª ed.
[2]
A sugestão é de João Mendes de
Almeida Jr., em seu Direito
Judiciário Civil, 2ª ed., p. 96.
[3]
Ainda esse nível de precisão é insatisfatório: na verdade, o direito
de agir, abstrato e autônomo, é coisa diversa da ação, movimento físico que se passa no mundo dos fatos,
necessariamente concreto. Sobre isso, cf. nosso “‘Extinção
do processo’ e mérito da causa”, no volume Saneamento
do processo - estudos em homenagem ao Prof.
Galeno Lacerda,
p. 44-45 (item 15).
[4]
Cf. nosso Doutrina e prática do
procedimento sumaríssimo, ps. 15 e segs. e, com notável precisão, Cândido
Dinamarco, Fundamentos do
processo civil moderno, ps. 272 e segs. Procedimento é forma, e a forma só é útil na medida em que serve à efetiva
composição dos litígios segundo a lei (cf., descontando-se alguns
exageros, Plauto Faracco de Azevedo, Justiça
distributiva e aplicação do direito, ps. 129 e segs.).
[5]
Nesse
sentido, Calmon de Passos, Comentários ao Código de Processo Civil (Forense), vol. III, p. 5.
Também Hamilton de Moraes e Barros,
“Aspectos gerais dos procedimentos especiais em face do novo Código de
Processo Civil”, Revista Forense,
n. 247, p. 13; João
Mendes, Direito Judiciário
Civil brasileiro, p. 227; Eduardo
Pallares , Diccionario
de Derecho Procesal Civil, p. 635. O conceito não é substancialmente
diverso entre os processualistas penais: cf. Hélio
Tornaghi, Instituições de
processo penal, vol. II, p. 307-308; Tourinho
Filho, Prática de Processo
Penal, p. 126; Magalhães
Noronha, Curso de Direito Processual Penal, p. 228;
Miguel Fenech, El
proceso penal, p. 185.
[6]
A metáfora é de Carnelutti, Instituciones del nuevo proceso civil italiano, trad. Guasp,,
p. 244.
[7]
Cf. Cândido Dinamarco, A
instrumentalidade do processo, p. 178, pedindo argumentos a
Elio Fazzalari, Istituzioni di
Diritto Processuale, ps. 22 e segs., e a Feliciano
Benvenutti, “Funzione amministrativa, procedimento,
processo”, in Rivista Trimestrale di
Diritto Pubblico, 1952. Mais recentemente, entre nós, Aroldo
Plínio Gonçalves, Técnica
processual e teoria do processo, ps. 102 e segs.
[8] “El juicio ordinario se basa y se ha basado siempre en el deseo de
acabar para siempre con el litigio entre las partes de manera judicial, de
tal modo que no sea posible un nuevo proceso sobre el punto resuelto (a
excepción de los remedios extraordinarios de revisión). Por ello es de se
desear en él la mayor extensión en el desarrollo de las pretensiones, de
tal modo que todas las relaciones litigiosas sean resueltas. Por ello se
permite a las partes completar del mejor modo posible sus sistemas de
defensas; por ello son amplios los medios de impugnación y los plazos que
los hacen accesibles; por ello se da a elegir a las partes entre toda una
diversidad de medios de prueba. El
conjunto justifica una copiosa serie de formalismos, preclusiones,
providencias jurisdiccionales etc. (Fairén
Guillén, El juicio
ordinario y los plenarios rápidos, p. 53).
10
Id., ib., ps. 54 e segs. Cf. também nosso citado Doutrina
e prática do procedimento sumaríssimo, ps. 17 e segs.
[10]
A questão está aí colocada em termos ideais. Na realidade do Direito legislado,
freqüentemente aparecem, ao lado desses procedimentos instituídos por
necessidade ou em atenção a uma real conveniência, alguns outros que só
se conservam e se explicam por simples inércia histórica ou por razões
ainda menos aceitáveis de lege
ferenda. Disso trataremos a seguir no texto.
[11]
Vejam-se, entretanto, as ponderações de Ovídio
A. Baptista da Silva, Procedimentos
especiais - exegese do Código de processo Civil, identificando
sumariedade substancial nos procedimentos especiais. A essa sugestão aderiu
José de Moura
Rocha, “Sobre procedimentos especiais”, no Anuário do Mestrado em Direito da UFPE, nº 5/92, p. 171.
[12]
Cf. João Bonumá, Direito
processual civil, vol. 2, p. 173, e a excelente lição de Galeno
Lacerda sobre o princípio
da adequação, nos Comentários
ao Código de Processo Civil, vol. VIII, t. I, p. 32 e segs.; Moraes e Barros, “Aspectos gerais dos procedimentos especiais”, in Revista Forense, nº 247, p. 13. Com referência ao direito
espanhol, mas com pertinência universal, Francisco
Ramos Méndez
faz ácida crítica à proliferação desordenada dos procedimentos
especiais -- que, aliás, ele identifica como vezo comum aos países
latinos: “En este momento, lo que necesitamos es un catálogo, es decir,
un vademecum, para saber qual es
el procedimiento especial adecuado para cada situación. Sin embargo, los Códigos no nos sirven porque la mitad de los
procedimientos especiales no vienen en el catálogo y hay que ir buscarlos
en leyes especiales.” (“La reforma de los procesos civiles especiales”,
in Justicia, 1990, vol. II,
p. 264, iniciado à p. 263).
[13]
Cf. Pontes de
Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil (de 1973), t. XIII, p. 3.
De resto, foi oportunamente lembrada a inspiração nitidamente ideológica
de alguns procedimentos diferenciados: Carlos
Alberto Alvaro de
Oliveira, “Procedimento e ideologia no direito brasileiro
atual”, in AJURIS, nº 33, ps. 79 e segs.
[14] Cf. Friedrich
Lent, Diritto processuale civile tedesco, p. 328.
16
Cf. Moura Rocha, “Sobre os
procedimentos especiais”, e Ovídio
Baptista, Procedimentos especiais, retro citados à nota 11. Este último
desenvolve a idéia também em seu Curso
de processo civil, vol. I, p. 97.
[16]
Quanto mais lento e ineficiente seja o sistema processual como um todo, mais
forte e incoercível se manifesta a tendência a desbordá-lo mediante a
derivação para os ritos sumários formais ou especiais abreviados, como
expediente de fuga ao procedimento ordinário. Fartamente o exemplifica Fairén
Guillén ao longo de seu excelente estudo citado à nota 7.
Exemplo dramático nos dá também o ocorrido no Uruguai, quando em vigor o
seu vetusto e só recentemente revogado estatuto processual. Já obsoleto ao
nascer (cf. Eduardo
J. Couture , na Exposición que acompanhou seu excelente mas malogrado Proyecto
de Código de Procedimiento Civil, publicado em 1945, e, sobre esse
mesmo trabalho, Enrique Vescovi, Derecho
Procesal Civil, vol. 1, p. 111) e tendo ultrapassado um século de vigência,
deu azo ao surgimento de uma pletora de leis especiais, muitas delas
supressivas da cognição (mediante generosa e desordenada criação de títulos
executivos extrajudiciais), outras instituidoras de infindáveis
procedimentos sumários formais, outras
ainda recorrendo
ao uso e abuso do modelo monitório ou do encurtamento de prazos --
tudo no esforço de escapar aos pesados e morosos trâmites do velho Código.
O exemplo uruguaio é particularmente ilustrativo, pois o processualista Luiz
Alberto Viera, ao
analisá-lo, adianta que todos esses tentames revelaram-se improfícuos.
(“Sobre el proyecto de nuevo código de procedimiento civil uruguayo”, in
Revista de Processo, nº 4, ps. 164 e segs.).
[17]
Precisa, no particular, a observação de Clóvis
do Couto
e Silva, Comentários
ao Código de Processo Civil, vol. XI, t. I, p. 6. Semelhante, aliás, é a solução italiana, onde
tanto o embargo de obra nova como a caução de dano iminente têm
tratamento típico de ações cautelares (cf. Mario
Dini, La denunzia di danno temutto, p. 101 e segs.). Quanto
à viabilidade da redução ao comum dos procedimentos interditais,
ou da maioria deles, v. Fairén Guillén,
Temas del ordenamento procesal, t.
II, ps. 653, 756 e 767.
[18]
A quase inacreditável experiência dessa jurisdição
consentida e de seus magníficos resultados ao longo de um milênio foi
analisada em detalhe por Fairén Guillén, El
tribunal de las aguas de Valencia y su proceso, passim.
[19] Cf. Mauro Cappelletti e
Bryan Garth, El
acceso a la justicia, ps. 101 e segs.
[20]
Cf. Apody dos Reis,
“O processo das pequenas causas: relato da primeira experiência”, in
Revista AJURIS, nº 26, p. 28.
[21]
V. g., por Kazuo
Watanabe, em prefácio ao livro Manual
das pequenas causas, de Cândido
Dinamarco.
[22]
Por exemplo, Rogério
Lauria Tucci, nos
primeiros capítulos de seu Manual dos
juizados especiais de pequenas causas.
[23]
Cf. Alcides de
Mendonça Lima, O
Poder Judiciário e a nova Constituição, ps. 60-61.
[24]
Ronaldo Cunha
Campos, “Processo, procedimento e direito material”, in
Revista Brasileira de Direito Processual, vol. I, p. 164 (artigo
iniciado à p. 153).
[25]
Sobre isso, disserta com clareza e precisão inexcedíveis José
Alberto dos
Reis, Processos
especiais, vol. I, p. 16. O grande jurista disseca, nessa página e nas
antecedentes, com exemplar exatidão, a distinção entre o erro de forma e
o erro de fundo. O tema foi também tratado pelo mestre de Coimbra em seu Comentário
ao Código de Processo Civil, vol. II, ps. 470 e segs., e no Código
de Processo Civil anotado, vol. 2, p. 289.
[26]
Cf. Calmon de
Passos, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. III, ps. 14 a 16; Barbosa
Moreira, “Antecedentes da reforma processual e sistemática
geral do novo Código de Processo Civil”, in
Revista do Instituto dos Advogados Brasileiros, nº 31, p. 7 e segs.;
nosso Doutrina e prática do
procedimento sumaríssimo, p. 41 e correspondente nota 45.
[27]
Luiz
Antônio de
Andrade ponderou,
com razão, não ser função de um artigo de lei adiantar a matéria a ser
tratada nos subseqüentes, aduzindo que, se pertinente, a regra deveria
figurar no início do Código. Essas idéias foram defendidas, sem êxito,
pelo então Deputado Célio Borja e, na Câmara Alta, pelo Senador Nélson
Carneiro (cf. Paulo C. A. Lima, Código
de Processo Civil -- crítica -- exegese, p. 151, e Calmon
de Passos, Comentários
e vol. cit., p. 6-7).
[28]
Retro, nota 12.
[29]
Cremos havê-lo demonstrado. quanto aos casos do art. 275 do CPC, em nosso Doutrina e prática do procedimento sumaríssimo, ps. 58 e segs.
[30]
O art. 943, parágr. único, diz, é verdade, que se observará o
procedimento ordinário, mas é óbvio que a regra jurídica só se pode
referir à tramitação posterior às aludidas providências, nas quais se
identifica precisamente o caráter especial do procedimento tratado no capítulo.
[31]
Por exemplo, o TJSP inadmitiu a cumulação da ação de prestação de
contas com a cominatória para prestação de fato (RT,
391/129); da ação investigatória de paternidade com a de alimentos (RT, 378/190); da ação de interdição com outra de rito ordinário
(RT, 241/304); da ação de
dissolução de sociedade com a de prestação de contas (RF,
136/163); da consignatória com a de rescisão de compromisso de compra e
venda (RT, 200/458). O Supremo
Tribunal Federal julgou incumulável ação possessória com a finium
regundorum (RF, 135/436); o
TJRJ (antigo) rejeitou o acúmulo de ação “executiva” com pedido de
falência (RF, 144/370); o TJSC
fulminou a cumulação de mandado de segurança e ação de reparação de
danos (Alexandre de Paula, Código
de Processo Civil anotado, vol. I, p. 97, nº 44). Já na vigência do
atual Código, o TJRS negou a cumulabilidade da especialíssima ação
investigatória da Lei nº 883/49 com a de indenização dotal, pelo
interessante fundamento da impossibilidade de manter-se o segredo de Justiça,
que a lei impõe à primeira, se adotado o rito ordinário (Rev.
de Jurispr. do aludido Tribunal, 60/366); o mesmo pretório recusou
cumulabilidade à ação de perdas e danos com a cominatória (Rev.
cit., 53/311). Certo, entre as teses sustentadas nesses acórdãos
algumas podem ser deveras discutíveis; outras, entretanto, são
absolutamente irrefutáveis. Como quer que seja, a notável recorrência do
tema nos pretórios e o profundo dissídio quando a algumas das soluções
por si mesmos evidenciam não ter a regra legal em foco a generalidade que
aparenta.
[32]
Tal é o caso de Pontes de Miranda,
- paladino da “preferibilidade do ordinário”
- em face da ação de amortização de cambial
cumulada com a “ação executiva”, admitida, para escândalo e alarme do
grande jurista, pelo TJSP: Comentários
ao Código de Processo Civil de 1939, t. II, p. 392, e de 1973, t. IV,
p. 70.
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